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segunda-feira, 29 de novembro de 2010

Nossa escola foi capa da Gazeta do dia 27/11/2010

DANIELLA OLIVEIRA
Especial para a Gazeta

Criança não é boneca. Essa conhecida frase, muitas vezes dita pelos pais, teve um conceito diferente para 36 alunos do 1º ano do ensino médio da Escola Estadual Vicente Luís Grosso, de São Pedro. Por meio do projeto "Nosso bebê nasceu. E agora?", o professor de ciências e matemática, Jorge Torres, de 38 anos, tentou mostrar aos estudantes - que ficaram 20 dias cuidando de bonecas - como seria se eles se tornassem pais ou mães na fase da adolescência. Divididos em casais, os alunos se surpreenderam com tamanha responsabilidade.

"Não estou preparada nem em sonho. Ser mãe é mais complicado ainda, porque tem que ficar muito mais tempo com a criança", analisou a aluna Alice Sales, de 15 anos.

Como o trabalho foi feito em dupla, quando alguém faltava, apenas um ficava com toda responsabilidade. "No meu caso, praticamente fui mãe solteira, o que foi mais difícil ainda", explicou Elizabete Marinho, 15.

De acordo com o professor, o objetivo principal da atividade foi observar a maneira com que o "recém-casal" cuidava do "recém-nascido". "Essa é a realidade de uma gravidez na adolescência. Os casais normalmente não se conhecem, iniciam a vida sexual precocemente e acabam engravidando", ressaltou Torres.

Considerada por muitos especialistas como uma fase bastante conturbada na maioria das vezes, em razão das descobertas, das ideias opostas às dos pais e irmãos e formação da identidade, a adolescência é um momento de transição entre a infância e a idade adulta.

"A sexualidade é um assunto muito relevante nessa fase. A iniciação da prática sexual, sem o uso de qualquer método de prevenção às doenças e à gravidez, tem que ser discutida em casa e também na escola", afirmou.

Além de serem monitorados pelo coordenador do projeto, os alunos e seus respectivos bebês também foram observados por todos os professores e funcionários da unidade escolar. Mesmo acontecendo apenas no horário de aula, os casais e os bonecos não puderam se separar durante os 20 dias.

"Eles se sentavam juntos e revezavam para cuidar da boneca. Tinha de levá-la ao intervalo, aula de educação física e até quando faziam lição". Tudo foi observado e relatado. "Se a merendeira visse alguém jogando a boneca ou esquecida em um canto, tinha que contar. Quando um dos dois precisasse ir ao banheiro ou até jogar bola, o outro ficava com o bebê".

EXPERIÊNCIAS. Mesmo sendo com bonecas, a maioria dos alunos chegou à conclusão que adolescência e gravidez, quando ocorrem juntas, podem trazer como consequências crises e conflitos. Eles afirmam que não estão preparados emocionalmente e nem financeiramente para assumir tanta responsabilidade.

Os alunos Laine Bontorim e Murilo Vitor Rachone, de 15 anos, disseram que a realidade só é divertida "quando a criança é mesmo uma boneca". Mesmo se esforçando para cuidar do brinquedo, Murilo conta que foi estranho passar o intervalo carregando uma boneca. "Fiquei com bastante vergonha, mas cuidei direitinho".

Além de fortalecer a amizade, os alunos João Paulo Beck e Aline Sales disseram que a experiência ensinou muito. "Não tenho condições nenhuma de ser pai. Além de não estar preparado, não teria como sustentar uma criança", declarou João.

Os 20 dias com a boneca fez com que os alunos Agda Vanessa Casemiro, Wesley Yuri Gonçalves, Aline Afonso e Guilherme da Silva pudessem rever vários conceitos. Mesmo cientes dos métodos de prevenção, eles não têm pressa para iniciar a vida sexual. "Mais difícil do que cuidar de um bebê é ter que conviver com um desconhecido. Não tenho nenhum pouco de pressa em namorar e muito menos fazer sexo", afirmaram.

ENCERRAMENTO. Na última quinta-feira, a turma se reuniu no pátio da escola para comemorar e apresentar o relatório final do projeto. Com as bonecas no colo, casais e até pais solteiros não esconderam a satisfação de vivenciar apenas uma atividade escolar.

Em unanimidade, os 36 estudantes festejaram o fato de "boneca não ser criança". A grande maioria ficou com nota 10 na disciplina. Mesmo com algumas discussões, reclamações e certa falta de compromisso, os fictícios filhos foram bem cuidados.

Antes de se despedir dos bebês trazidos pelas alunas, Jorge Torres entregou uma mensagem dentro de um coração de papel e um preservativo como símbolo do trabalho. "Que o projeto sobre gravidez na adolescência te ajude a repensar suas atitudes e sinalize que suas ações têm consequências. Se cuide", desejou.

Quando o caso é real: a importância do apoio da família

Ao contrário das colegas que passaram 20 dias cuidando de bonecas para vivenciar uma atividade curricular, a aluna B., de 15 anos, vai ter um bebê no início do ano que vem. Mesmo com todas as informações recebidas em sala de aula e também em casa, ela explica que por causa de "uma paixão incontrolável", iniciou a vida sexual com um adolescente de 16 anos, que namorou por quase um ano. A atração era tão forte que o casal deixou de freqüentar as aulas do período matutino para ficar junto na casa do jovem.

Sem ao mesmo comentar sobre os métodos de prevenção, os adolescentes encararam a experiência simplesmente como uma forma de prazer - até pouco tempo desconhecida para ambos. Mesmo arrependida com o jeito, B. disse que será uma boa mãe. "Vou cuidar direitinho e dar bastante amor. Com ajuda da minha família, não vou precisar abandonar os estudos", declarou.

Diferente da menina e de seus pais, o adolescente, que mora com os avôs e mantém constante relacionamento com a mãe, encarou a notícia da gravidez de maneira bastante diferente.

Logo que ela lhe mostrou o resultado do exame, o namoro acabou e o jovem mal fala com ela. Segundo a mãe da adolescente, o desprezo da família e o fim do namoro foi uma surpresa. "Logo que a gravidez foi confirmada, fui falar com o pai da criança e sua família. Para minha indignação, eles disseram que a culpa foi minha, porque não segurei minha filha em casa".

Depois de alguns meses de desprezo, a adolescente resolveu dar mais atenção aos estudos e cuidar bem da saúde. As notas na escola aumentaram e seu estado emocional melhorou. "Eu me relacionei com uma pessoa imatura e agora vou enfrentar as consequências. Mas, graças a Deus, tenho o apoio e amor da minha família para me ajudar com a criança".

Para a mãe, é insano fazer com que um casal, de 15 e 16 anos, more junto e cuide de um bebê. "Seria responsável pelo abandono de três incapazes. Teria mais problemas do que agora". Mesmo assim, a mãe de B. faz questão que o adolescente garanta a paternidade e ajude, pelo menos, financeiramente com o sustento da criança. "Até agora - no sétimo mês de gestação - não tivemos ajuda nenhuma. Mas, é direito da criança ter o nome do pai na certidão de nascimento".

ATENDIMENTO. Há quatro anos, das 90 gestantes atendidas na Unidade Mista de Saúde (UMIS) de São Pedro, cerca de 30% tinham entre 13 a 17 anos. Em 2007 e 2008, o serviço de saúde pública da estância comemorou a redução para 15%, das cerca de 120 mulheres grávidas.

Atualmente, mesmo com o excesso de informação e diversas discussões promovidas nas escolas sobre os métodos de prevenção de Doenças Sexualmente Transmissíveis (DST) e a gravidez precoce, das 160 gestantes de São Pedro, 18% são adolescentes.

De acordo com a ginecologista e responsável pelo setor de obstetrícia da UMIS, Sheila Gimenez, o que mais preocupa é que das cerca de 100 adolescentes atendidas nos últimos três anos, 20% estão grávidas pela segunda vez.

"Na maioria das situações, a falha é dos pais. As meninas chegam ao consultório e não demonstram responsabilidade nenhuma sob o bebê", disse.

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